sexta-feira, 26 de outubro de 2012

A MONTAGEM


      Para entender Fando e Lis - Amanhã Seremos Felizes é necessário um desprendimento do racional. Há que se deixar levar pelas impressões emocionais e sentimentos. Só aí então, elaborar um pensamento, verificar resíduos que permitam discussões e questionamentos. A encenação deixa subjacente o discurso intelectual para ser ação no presente. Uma montagem realizada para alcançar diversos públicos sem perder as características de teatro do absurdo.

      Falar sobre a concepção do espetáculo poderia reduzir qualquer interpretação do espectador. Entretanto, pode-se dizer que a montagem está ancorada sob a ótica do inconsciente, do onírico, do absurdo. E é nessa dimensão que se encontram as personagens - um mundo desconfigurado. Nesse cosmos, Fando e Lis  são peregrinos , órfãos e sem abrigo, vagueando perdidos pela estrada que leva a Tar, acreditando que aí encontrarão finalmente a felicidade - que é o mesmo que dizer: a revolução que libertará das dores, das amarras, da violência. Mas eles voltam sempre ao mesmo lugar sem sequer ter a consciência de que o que os afasta de Tar não é uma distância geográfica, mas essas dores, amarras e violências. Há que se matar isso para a angústia ter fim.  Custa-nos a peregrinação a Tar, e talvez até desistíssemos dela, não fosse um vago vislumbre que nos guia sussurrando: "Não desistas, estas sempre à beira de lá chegar." E nunca lá chegamos, porque, estando lá achamos que Tar é mais além, naquele lugar inalcançável onde só sabemos que corre um rio e tudo é possível.

      Não somos nem bons nem maus, apenas muito humanamente inconsciente de  nós, dos outros e do mundo. Adultos-meninos estamos subjulgados pela obscuridade das pulsações, dos ruídos e silêncios que não nos deixam ouvir o coração. Ao ouví-lo, talvez se chegue a Tar, talvez uma nova consciência da existência. "O drama da condição humana advém unicamente da consciência. Obviamente, a consciência e suas revelações permitem que criemos uma vida melhor para nós mesmos e para os outros, mas o preço que pagamos por essa vida melhor é alto. Não é só o preço do risco, do perigo e da dor. É o preço de conhecer o risco, o perigo e a dor. Pior ainda: é o preço de conhecer o que é o prazer e de conhecer quando está ausente ou é inacessível." António Damásio - O mistério da consciência.

      Fando e Lis - Amanhã Seremos Felizes mostra a ação da força da natureza, um turbilhão incontrolável que determina o andamento desse intrigante e absurdo enredo carregado de muita simbologia. Uma produção atenta aos detalhes da representação, do visual, da paisagem sonora, sem deixar de lado a força da palavra. O processo de ensaio iniciou em outubro de 2010 e desde lá houve muita pesquisa, debates, dúvidas, resoluções e... ensaios. É com muito prazer que desejamos um ótimo espetáculo à todos.

 

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